19 fevereiro 2006 

O divorcio - Parte 3 de 3

Ele saiu do banho, estava quase cheiroso. Enrolou-se na toalha e fez a barba. Ela continuava a procurar a papelada. Eles formavam uma bela dupla, ela admitia. Ele se estragava e ela o consertava. Ou quase. Nunca soube como as outras mulheres dele conseguiram ser mulheres dele sem serem enfermeiras. Ele saiu do banheiro e encontrou seu copo cheio.
-Clarissa, eu te amo.
-Escuta, Rô, você não tem mesmo idéia de onde botou os papéis?
Ele deu com os ombros.
-Roberto, seu crápula.
-Sério, não sei mesmo.
-Ta, senta aí e vamos fazer um curativo pra isso.
Ele sentou. Ela era rápida, dois minutos e estava tudo pronto. Ele ficou de pé, de toalha, chinelas e o copo na mão. Chamou-a para perto e enfiou-lhe a língua na boca. Ela não negou o beijo, mas também não se afastou. Ele agarrou aquela bunda como só ele fazia e levantou a saia dela. Foi então que ela se entregou de todo. Ela tirou a blusa enquanto a ereção dele se encarregava da toalha debilmente enrolada. Foram pra cama e só saíram de lá duas horas depois.
Claro que não foderam o tempo todo, ele não era nenhum professor de sexo tântrico. Ela levantou-se e olhou para o chão. Estava ali a papelada. Ele realmente havia assinado. O fato de estar tudo manchado de vinho era só um detalhe, com certeza não proposital. Ele sentou-se na cama e olhou para a bunda dela. Como amava aquela bunda.
-Olhe Roberto, achei os papéis.- ela mostrava o documento por cima do ombro.
-Tudo fica mais fácil depois de uma boa foda, não?- ele sorriu.
-Não seja besta.
-Que foi?
-Está tudo manchado de vinho, não está vendo?
-Desculpe, estava olhando para sua bunda.
Ela levantou e se virou. Ele também amava os seios, mas não se comparavam a bunda.
-O que você vai fazer?- perguntou ele.
-Eu vou ter plantão hoje, vou começar as dez. Amanhã eu ligo para o advogado e peço uma nova cópia.
-Não quer ligar daqui?
-Está com pressa?
-Você sabe que não.
-Seu telefone não esta funcionando, eu testei quando você estava no banho.
-Hum.
-Eu passo aqui para te entregar qualquer dia. Você vai estar em casa?
-Você sabe que eu não saio.
-É.
Ela se vestiu e ajeitou o cabelo. Curto, liso. Não deu muito trabalho. Ele levou-a até a porta como estava.
-Eu te amo Clarissa.
-Eu te vejo qualquer dia.
Ela sorriu e se foi. E rebolava. Caminhou em direção à lata velha, onde tinha seu uniforme de enfermeira. Ela podia se trocar no transito. Sempre fazia isso. Achava engraçados os homens babando e perdendo a hora de passar o sinal.
Roberto ficou olhando fixamente ela partir. Como amava aquela bunda.

16 fevereiro 2006 

O divorcio - Parte 2 de 3

Ela remexia os livros soltos por cima da mesa. Ele girava o gelo no copo com o dedo, e olhava a bunda dela. Serviu outro copo. Ela encontrou lia as capas dos livros com mais atenção.
-Nossa Roberto, você realmente está lendo isso?
-É, quem sabe.
-E esse aqui? Você ainda não acabou? É um clássico!
-É bonzinho. Meio parado.
-Como assim “bonzinho”? Ele é fantástico! É um clássico!
-Foda-se que é um clássico.
Ela deixou de lado os livros de lado e viu um pouco de sangue no chão.
-Roberto, o que é isso?
-Sangue.
Ela fez uma cara de quem diz “você sabe que não foi isso que eu quis dizer seu idiota” ou algo parecido. Ele respondeu:
-Oquei, e está coagulado. Feliz?
-O que aconteceu?
-Eu virei adolescente rebelde sem calça por um dia e cortei os pulsos.
-Sério?
-Claro que não! Pelo amor de Sócrates, você ainda leva sério essas bobagens!
-E você ainda fala desse Sócrates como se fosse Deus.
-Ele era muito mais filho de Deus do que aquele cabeludo metido a bom cristão.
-Certo, agora o que aconteceu?
-Bom, uma garrafa quebrou uns tempos atrás, e tinha um caco grande ai. E eu nunca uso sapatos.
-Certo, deixe-me ver o seu pé.
-Não foi nada.
-Dá cá a pata!
Ela empurrou-o e ele caiu sentado na cadeira que estava atrás. A bebida do copo sacudiu, mas não chegou a cair, já não estava mais cheio o suficiente.
-Uh, isso aqui está feio.
-Eu já disse que não foi nada.
-Tem um caco de vidro quebrado ai dentro. A quanto tempo você disse que foi isso?
-Eu não disse.
-...
-Três dias.
-Três dias!
-É, mas não ta doendo.
-Claro, você está sempre anestesiado.
-Por que você ainda faz isso?
-É meu dever como enfermeira querido. Agora, vai doer um pouco.
Ela enfiou a pinça no corte inflamado. Saiu um pouco de pus e Roberto fez uma cara de quem não gostou. Ela alcançou o vidro, era grande. Triangular. Começou a puxar, Roberto gritou. Ela puxou mais, ele agarrou a garrafa de vodka de cima da mesa e bebeu no gargalo enquanto apertava com a outra mão a cadeira. O copo caíra no chão, inteiro.
Quando acabou ela tirou a garrafa da mão dele e usou para desinfetar, com um pouco de algodão que ela trazia na bolsa para retirar o esmalte. Ela falou.
-Pronto, agora vá tomar um banho, depois eu limpo isso de novo.
Ele entrou no chuveiro, de camisa e tudo. O sangue escorreu com água para o ralo. Ele lavou-se com sabão. Ela Juntou os cacos todos e limpou o sangue. Encheu o copo dele e deixou perto da saída do banheiro. Arrumou as coisas que estavam na cama e trocou os lençóis. Arrumou os livros todos nas prateleiras. Em ordem alfabética. Obsessiva, compulsiva.

15 fevereiro 2006 

O divorcio - Parte 1 de 3

Ele ouviu o carro dela chegando. Ruído característico da lata-velha. Ele trajava apenas a camiseta com a qual dormira e uma cueca antiga. Ela uma saia justa nas coxas e alguma peça de roupa muito decotada, salto alto preto. Ela bateu na porta e esperou. Ele olhou-se no espelho enquanto levantava da cama para atendê-la. “Não fiz a barba ainda essa semana, está na hora”, pensou. Ela tornou a bater.
-Abre logo essa porta Roberto, eu sei que você ta ai.
Ele caminhou devagar, passou pela cozinha. Estava imunda. Estava imundo.
-Porra Roberto, abre a merda dessa porta.
Ele Abriu.
-Hum? - disse ele.
-To tentando te ligar a duas semanas, o que aconteceu?
-Eu não atendi.
-Engraçadinho. Já assinou os papéis?
-É, tão por aí.
-Pode pegar?
Ele vira pra trás e olha o lugar. Garrafas de cerveja, embalagens vazias, pratos sujos, copos sujos, uma garrafa de vodka quebrada, um copo com um resto de vinho azedo, uma caixa de leite, outra de suco, mais algumas garrafas vazias e copos sujos.
Virou-se para dar caminho para Clarissa, entendeu o braço para dentro da casa e disse:
-Se achar é seu.
-Seu traste, não acredito que estás fazendo isso!- esbravejou ela.
-De quem é o interesse?- ele sorriu e levantando as sobrancelhas.
E dizendo isso se virou e seguiu em direção ao quarto. As pernas brancas andaram flacidamente pelo caminho. Pegou um copo próximo e botou gelo. Encheu de vodka até a borda...
-Você continua bebendo tudo isso Roberto?
-Bom Clarissa, você sabe como é. Minha mulher quer o divórcio, meu pai morreu ah umas duas semanas...
-Ah não, nem me venha com essa.Você sempre odiou seu pai, e bebia desde quando nos conhecemos. Vai dizer agora que o divórcio afetou sua “estabilidade emocional”.
Ela remexia entre os papéis soltos na mesa. Ele estava numa grande ressaca. Já havia se acostumado com as grandes ressacas. Era perto das cinco da tarde e ele recém saíra da cama.
-Eu te amo Clarissa.
-Claro Roberto. Claro.
-É sério, você sempre foi uma boa foda.
-É isso que eu sempre fui pra você? Uma boa foda?
-Bom, eu amo uma boa foda.
-Que droga Roberto! Eu também adoro uma boa foda, mas será que esse tempo junto comigo você só pensou em mim como uma boa foda? É por isso que não posso ficar com você , Roberto. Você é um canalha!
-Você sempre soube que eu era um canalha. Foi a primeira coisa que eu te disse quando fomos apresentados.
-E como é que eu ia saber que não era uma brincadeira de algum engraçadinho tentando aparecer? “Oi, meu nome é Roberto, eu sou um canalha”. Me poupe!
Ela não encontrou nada na mesa, mas organizou os copos todos juntos em um canto, e tirou os cacos de vidro e botou-os no lixo. Dirigia-se para a mesa do quarto.
-Oquei, eu confesso. Você sempre foi boa em arrumar a casa também.
-Você não presta mesmo.